sexta-feira, 1 de julho de 2016

Perfeito?!? Suficientemente bom...

Já aqui falámos algumas vezes da importância de experienciarmos e sentirmos efectivamente todas as emoções, as agradáveis e as desagradáveis... de como a alegria não é a mesma sem haver tristeza. E se procurássemos essa mesma aceitação do nossa realidade interna, na realidade exterior?
Por vezes, fico com a sensação de que vivemos num mundo excessiva e (até mesmo) ridiculamente optimista. Somos invadidos pela ânsia de uma vida perfeita: corpos perfeitos, o trabalho perfeito, o sucesso (comprovando o quão perfeitos somos profissionalmente); as relações perfeitas, em que se é completa e perfeitamente compreendido pelo outro e em que também a intimidade é perfeita; os filhos perfeitos, que se relacionam perfeitamente uns com os outros e que terão, também eles, vidas perfeitas; a casa perfeita, perfeitamente limpa e arrumada; a família perfeita, a rede social perfeita, a cidade perfeita... E estas perfeições precisam, também elas, de ser perfeitas, e, como tal, duradouras, permanentes no tempo. Para além disso, em quase todo o lado assistimos ao apelo de felicidade, excelência, satisfação plena.
Quando é que deixámos de poder ver o copo meio vazio?! Será que, nos dias de hoje, todos temos que nos sentir alegres, satisfeitos, bem sucedidos, excelentes cozinheiros, ambiciosos, empreendedores, os melhores amantes, grandes desportistas...?!? E, pior, sempre?, e simultaneamente? Por que é que apenas a versão perfeita e imaculada de algo é que vale a pena?
É verdade que o perfeccionismo pode ser bastante útil em muitas situações: importa conseguirmos imaginar bons cenários, que nos ajudarão a reunir a energia e foco necessários para procurarmos torná-los reais. Mas lembremo-nos de que somos sempre primeiramente expostos à competência do profissional experiente, que esses “bons cenários”, bem sucedidos, são resultado de muito trabalho, de alguns erros, de alguns cenários menos bons. Precisamos, por isso, ser também capazes de elaborar imagens mais sensatas que nos mostrem a dificuldade ( e por vezes o sofrimento) que está por trás daquilo que admiramos e desejamos alcançar.

Ser um “bom perfeccionista” implica ser capaz de tolerar, e perdoar, os tormentos da imperfeição (em nós próprios e nos outros) por longos e, quase sempre, difíceis períodos... aceitarmos que “suficientemente bom” pode ser bom o suficiente.



Ana Luísa Oliveira escreve de acordo com a antiga ortografia.

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